Nós vamos a caminho de uma
torrada em pão de Mafra, de uma meia de leite e da leitura do jornal. Tranquilos
e de coração leve.
Na nossa direcção vem mais
um madrugador. Terá cerca de quarenta e muitos cinquenta anos e está vestido de
fim-de-semana, classe média, normal. Como nós.
Pára à nossa frente,
hesitante e embaraçado. E fala baixo, envergonhado, com os olhos a piscarem num
esforço para não chorar.
Está desempregado. Não tem
dinheiro e a mulher está em casa doente. Classe média, normal. Como
nós.
Em Portugal há quase 900
mil desempregados. A cada desempregado estão ligadas pessoas. 900 mil dramas
vezes quanto?
Fomos educados numa
cultura judaico-cristã que nos transmitiu conceitos de pecado e castigo, de
culpa, arrependimento e perdão. Eu aprendi a lição e por isso não perdoo a esta
gente gananciosa que durante décadas, se serviu e teceu a rede de cumplicidades
que atirou o país e as pessoas para o desespero.
Estas criaturas que de
pessoas só têm a aparência física, arranjaram forma de escapar à Justiça dos
homens, mas não escaparão à Justiça Divina nem à minha praga rogada com tanta
raiva: desejo-lhes que ardam no inferno. Em vida e depois de mortas.
Afinal o dia está frio, sombrio e o chão coberto de
folhas mortas e apodrecidas. Não devíamos ter saído de casa.
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